Idosos das periferias de SP voltam a dançar após vacinação contra a Covid

Com samba-rock, bolero, chá-chá-chá ou forró, bailes da terceira idade em São Paulo têm atividades com capacidade total

SÃO PAULO | AGÊNCIA MURAL —Antes da pandemia, João de Macedo Oliveira, 79, sempre terminava seus compromisso até às 15h. Essa era a hora que ele começava a se arrumar para os bailes da terceira idade, uma tradição em diversas regiões da cidade de São Paulo. As restrições da Covid, porém, o obrigaram a interromper a rotina.

“Fez bastante falta”, lamenta o morador do Jardim Jabaquara, na zona sul da capital paulista. Para não ficar na inatividade, o representante comercial passou a caminhar no próprio quintal. Mas agora, após a aplicação de diversas rodadas de vacina, ele e outros idosos voltaram a frequentar as festas.

“É uma ginástica e faz bem para a mente e o corpo, eu gosto muito de dançar”, diz Macedo, ao se referir aos bailes que frequenta três vezes por semana. Às terças-feiras, ele tem presença garantida no evento Terças de Gala, do Atlético Ypiranga, também na zona sul. Ele tem até uma mesa cativa, a de número 33.

Bolero, chá-chá-chá ou forró, seja qual for o ritmo, Macedo aproveita. A paixão, diz, vem desde a juventude, quando dançava gafieira e correria maratonas e São Silvestres.

A pandemia de Covid mexeu com o cotidiano da maioria da população e afetou especialmente os idosos, afirma Benedito Cipriano, 77, morador da Vila Ré, na Penha, zona leste da capital. Ele também é frequentador de bailes e conta que seus fins de semana pré-Covid eram regados a muito samba-rock.

Com a pausa na pandemia, Cipriano se dedicou arduamente ao trabalho como tapeceiro. Só voltou aos bailes quando tomou as três doses da vacina no braço.

João de Macedo Oliveira dança com sua amiga, a advogada Joana Simas, 66, no baile Terças de Gala do Clube Atlético Ypiranga
João de Macedo Oliveira dança com sua amiga, a advogada Joana Simas, 66, no baile Terças de Gala do Clube Atlético Ypiranga – Eduardo Knapp/Folhapress

Ainda assim, ele chegava cedo e se despedia logo que percebia uma aglomeração de pessoas. A namorada era sua única companheira de dança e, entre uma música e outra, saía do salão para tomar um ar. Ficar sem máscara, nem pensar.

“A gente chegava cedo ao baile, tinha poucas pessoas. Eu pegava sempre um lugar mais arejado, onde tinha uma ventilação. Se enchesse, ia embora”, lembra.

Para Macedo, os estabelecimentos foram cautelosos no retorno. Na porta, ofereciam álcool em gel e solicitavam o passaporte vacinal. Tirar a máscara somente na mesa, afirma. Cuidados que Teresinha Alves de Jesus, 68, também tomou ao retornar às aulas de afromix no Parque Nabuco, próximo de onde mora, no Jardim Miriam, zona sul da capital.

Mantendo a precaução, ela pedia para que os alunos abrissem os braços em todas as direções, a fim de evitar o contato durante a dança.

“Dava mais ou menos um metro e meio de distância de uma [pessoa] para outra”, explica ela, que ensina a dança há 11 anos.

À direita, João de Macedo e a advogada Joana Simas se divertem na pista de dança com os amigos
À direita, João de Macedo e a advogada Joana Simas se divertem na pista de dança com os amigos – Eduardo Knapp/Folhapress

Com a quarentena, e fechamentos dos parques, a educadora física aposentada tentou continuar as aulas de modo virtual para seus 70 alunos, mas não deu conta. Para distrair a mente, passou a confeccionar e vender bolos.

O contato com os participantes continuou por meio de um grupo de WhatsApp, que acabou virando uma rede de apoio no período mais crítico do isolamento, em que muitos perderam parentes —e ela, alunos. O grupo “chovia” de mensagens questionando o retorno do afromix, diz a professora.

No retorno, a instrutora se deparou com a quadra do parque praticamente vazia. “Teve dias de eu chegar aqui e não ter quase ninguém, fiquei desanimada, mas depois eles foram acreditando na vacina e chegando devagar. Agora está cheio”, conta.

Segundo Alves, alguns frequentadores inclusive ficam chateados atualmente quando não conseguem ir por algum motivo. Por isso, as aulas ocorrem até em dias de chuva, em um espaço coberto. “Não deixa de ter, faça sol ou chuva. A gente dá um jeitinho.”

“Gosto muito e tenho muita honra de dar aula para terceira idade, é um pessoal muito bacana, muito amigo. Eu me sinto realizada, é muito gratificante”, declara a instrutora, que mantém o trabalho com uma ajuda de custo voluntária dos participantes, com a venda de uniformes para a dança e com a organização de viagens.

Hoje, o tapeceiro topa todos os ritmos e nas festas de família é o rei das coreografias. “Quando tem casamento, festa, se eu não for, não tem. É a maior felicidade da minha vida.”

Cipriano chegou a ser criticado pelos familiares quando retomou a dança, por ser idoso e gostar da atividade, mas agora é conhecido como o “superidoso”, apelido carinhoso que recebeu da namorada Marli Rabelo de Carvalho, 50, que conheceu nos bailes.

Apesar do sucesso nas festas, ele segue modesto. “Não sou um bom dançarino, faço o que eu sei fazer. Não invento muito porque a idade também não permite que você faça movimentos muito bruscos,” diz.

LEIA TAMBÉM

Deixe um Comentário